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quinta-feira, 16 de junho de 2011

A terceirização da democracia e a privatização das eleições no Brasil (2)

Escrito por José Rodrigues Filho   
 


A literatura internacional é rica em exemplos espetaculares de falhas e riscos nos processos de terceirização de Tecnologias de Informação (TI) no setor público. No Brasil existe uma abundância tanto na aquisição quanto na terceirização de TI, porém pouco se conhecem os fatores de riscos inerentes às práticas de terceirização. Para se ter uma idéia do crescimento do investimento em TI no país, basta dizer que o Brasil é o segundo maior investidor entre os países do chamado BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China), ficando atrás apenas da China.

No caso do setor público, os fatores de riscos oriundos da terceirização afetam a sociedade como um todo, sobretudo os funcionários públicos que começam a sofrer com os salários corroídos, enquanto perspectivas vantajosas são comemoradas, principalmente por corporações internacionais. Por conta destes riscos, o governo tem a obrigação de responder a questões tais como: quais são os principais fatores de riscos expressos nos contratos de terceirização? Quais as principais corporações internacionais envolvidas com a terceirização de TI no Brasil? Num mercado quase monopolista, quando existem poucos fornecedores, torna-se necessário conhecer se a aquisição ou terceirização destas tecnologias estão se dando por conta de uma necessidade da sociedade ou por interesses das grandes corporações.

Considerando que o governo é o maior coletor de informação dos cidadãos, a relação entre terceirização e privacidade vem merecendo muitas preocupações. Qual a garantia que os cidadãos têm de sua privacidade, quando empresas privadas, sobretudo de outros países, podem ter acesso aos nossos dados? Até que ponto a legislação internacional dos países de origem das corporações com contratos com o governo brasileiro afetam a nossa privacidade?

A legislação internacional anti-terrorista dos Estados Unidos, por exemplo, cria as condições legais que expande o poder das agências de inteligência policial, a exemplo do chamado FBI, para obter informações de cidadãos de qualquer país. Isto pode acontecer mediante contratos de vendas ou de terceirização de TI, ou seja, quando empresas americanas prestam serviços aos governos de outros países. Portanto, nossas informações podem ser repassadas para o FBI, por exemplo, sem que nem o governo nem os cidadãos estejam sabendo do que está acontecendo.

Estudos recentes realizados no Canadá mostraram a preocupação de cidadãos canadenses com os contratos de terceirização do governo com empresas canadenses, vinculadas a corporações americanas. Por conta disto, o Sindicato dos Servidores Públicos de uma Província canadense questionou o ministro da Saúde, que tinha um contrato de terceirização de determinadas funções na área de saúde com uma empresa canadense vinculada a outra empresa americana. Significava que as autoridades americanas poderiam ter acesso às informações de cidadãos canadenses, mesmo sem a autorização deles, e serem até investigados pelo FBI. Para evitar isto, houve uma mudança da legislação no sentido de proteger os cidadãos.

Uma vez que no Brasil a empresa fabricante de urnas eletrônicas é a multinacional Diebold, é provável que estejamos submetidos à lei anti-terrorista americana, ou seja, ao chamado Patriot Act, que amplia o poder policial americano para ter acesso às informações de qualquer cidadão brasileiro e julgá-lo na forma desta lei. Assim sendo, a invasão da privacidade neste país está escancarada, já que o projeto de voto eletrônico demonstra ser direcionado por possibilidades tecnológicas e conveniências burocráticas, ao invés de ser um projeto democraticamente debatido e de utilidade social.

Para gerar mais preocupações, as próximas eleições serão realizadas através de urnas biométricas, quando será criado um dos maiores banco de dados do mundo, com informações valiosas de todos os eleitores brasileiros. Não há dúvidas de que muitos estão interessados neste banco de dados, uma vez que poderão acessar nossas informações sem que sequer tenhamos conhecimento disto. Países pobres da África e o Haiti já se submeteram às urnas biométricas. Na próxima eleição será a nossa vez, segundo a Justiça Eleitoral. Por que isto não acontece nos países ricos, sobretudo nos países da Europa? Por sermos cidadãos de países pobres ou em desenvolvimento temos que ser vigiados ou vistos como supostos terroristas? A quem interessa o nosso corpo digitalizado, através de testes biométricos?

Em que pese todas as denúncias e críticas sobre as falhas e vulnerabilidades das urnas eletrônicas por renomados cientistas brasileiros e internacionais, conforme estão relatados nos seguintes sites (http://www.votoseguro.org/; http://www.fraudeurnaseletronicas.com.br/), e as evidências de que o nosso sistema de contagem de votos não é transparente e está sob o controle do mercado, ferindo o mais sagrado princípio de uma democracia, o voto eletrônico no Brasil é comemorado como sendo uma grande, embora falsa, realização nacional. O pior de tudo isto é que neste mercado temos de ser submetidos aos interesses de um único vendedor.

 
José Rodrigues Filho é professor da Universidade Federal da Paraíba. Foi pesquisador nas Universidades de Johns Hopkins e Harvard.




Um comentário:

  1. O texto acima nao está completo e pode ser lido no blog acima citado, ou seja,

    http://jrodriguesfilho.blogspot.com/

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